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Taxação de super-ricos pode render US$ 250 bi em receitas por ano

Discussão no G20 é inicial e será necessário definir o desenho exato da proposta, mas nem todos os países do grupo apoiam a criação de impostos sobre as fortunas. Especialista diz ser “utópico” pensar em um acordo consensual a respeito do tema

A taxação global dos super-ricos, principal bandeira erguida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no âmbito do G20, poderia gerar US$ 250 bilhões em receitas por ano. Os cálculos do economista francês Gabriel Zucman, diretor do European Tax Observatory, consideram uma alíquota mínima anual de 2% sobre o patrimônio, que atingiria cerca de 3 mil pessoas em todo o mundo.

A discussão é inicial, ainda será necessária uma definição sobre o desenho exato da proposta que deve ser feita de forma democrática a partir do debate entre os países que compõem o grupo, formado pelas 19 maiores economias do mundo mais a União Africana e a União Europeia.

Zucman explicou ainda que o modelo de tributação poderia levar em conta os impostos gerais pagos pelos bilionários e que seria uma espécie de “piso tributário”. Caso um indivíduo, no cômputo geral, pagasse menos de 2% de sua riqueza total em imposto de renda, por exemplo, ele teria que pagar um imposto adicional para atingir essa porcentagem mínima.

Para que a proposta avance, existem alguns percalços. Um acordo firmado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), chamado Imposto Mínimo Global (GMT), prevê dois pilares: o primeiro visa distribuir os direitos de tributação sobre os lucros das multinacionais entre os países, e o segundo estabelece uma tributação mínima para essas empresas globais. A ideia de Haddad é completar essa trilha com um terceiro pilar para pessoas físicas.

Um acordo sobre a construção de uma tributação para riqueza foi celebrado em 2021, dentro do pilar 2, envolvendo 136 países e a aprovação da proposta que prevê um imposto mínimo global de 15% sobre a lucratividade das multinacionais. Desde então, o tema prosperou na jurisdição de 55 países, segundo a OCDE. As discussões sobre um pilar 1, no entanto, seguem travadas — algo que também pode acontecer com a proposta brasileira.

Para o coordenador do curso de relações internacionais do Ibmec, José Niemeyer, o que foi apresentado por Haddad se assemelha mais a um protocolo de intenções e fazer com que essa tributação chegue a pessoas físicas deve ser mais difícil. “Não é algo original, já existiam propostas nesse sentido. Chegamos a um nível de desigualdade entre os super-ricos e a grande população deste planeta tão alarmante, do ponto de vista de acesso à renda, emprego e benefícios sociais, que é importante começarmos a pensar em maneiras de amenizar esse fosso”, disse.

O Brasil reconhece que há diferentes visões no G20 sobre a taxação de bilionários e nem todos os países do grupo apoiam a criação de impostos para super-ricos. O próprio autor dos estudos, Gabriel Zucman, disse ser “utópico” pensar que existiria um acordo consensual total sobre o tema no mundo. Mas, de acordo com a Fazenda, países europeus já se alinharam com Haddad nesse sentido.

A discussão que estava caminhando anteriormente na OCDE inclui para onde iria o dinheiro arrecadado. Esse é apenas um dos pontos que precisam ser definidos antes da nova colocação sugerida pelo ministro brasileiro. Apesar dos possíveis entraves, Niemeyer acredita que o tema ganhará projeção. “Haddad tem sido alguém que todos ouvem muito em relação à economia e tem aparecido, às vezes, muito mais do que o próprio presidente”, avaliou.

Arrecadação

Menos de 8% da arrecadação dos países do G20 vêm da taxação da riqueza, ao mesmo tempo em que mais de 32% vêm do consumo, é o que aponta um estudo realizado pela organização não governamental Oxfam. A situação beneficia os mais ricos e prejudica as camadas mais pobres da população, já que famílias de menor renda costumam destinar proporcionalmente fatias maiores de seus orçamentos para o consumo.

A maior parte da riqueza dos bilionários está concentrada em ações de empresas listadas em bolsa ou em títulos. Mesmo participação em empresas não listadas pode ser precificada, comparando com contrapartidas de capital aberto. “O que se sabe disso é que não é uma taxação da propriedade em si, mas sobre o retorno do investimento e a continuidade de crescimento desse patrimônio que volta a ser investido não no sistema produtivo, mas exclusivamente no sistema financeiro, aumentando o distanciamento social”, explicou Vladmir Feijó, professor de relações internacionais.

Os dados levantados mostram também que os impostos mais altos sobre os rendimentos do 1% mais rico de 17 países do G20 caíram em cerca de um terço entre 1980 e 2022, passando de quase 59,5% para 40,4% em 42 anos.

No mesmo período, a renda do 1% mais rico cresceu de 11% do rendimento nacional para 16% em suas respectivas nações, um ganho de participação de 45% no período, segundo dados do World Inequality Database. Só em 2022, o rendimento do 1% mais rico do G20 foi de mais de US$ 18 trilhões, mais do que o Produto Interno Bruto (PIB) da China, a segunda maior economia do planeta.

O fórum terminou com a expectativa otimista e ambiciosa de Haddad de que a presidência brasileira do G20 entregue uma declaração conjunta sobre a tributação internacional de bilionários até julho, quando acontece o próximo encontro dos ministros das finanças. Por ora, o próximo passo prometido é um relatório escrito pelo diretor do European Tax Observatory, que deve ser entregue ao ministro da Fazenda nos próximos meses.

0303 tributação internacional G20(foto: Lucas Pacífico)

O Noroeste

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