Trata-se do acordo entre “tradings” (responsáveis pela exportação e importação) e processadoras do grão que proíbe comprar soja das fazendas com cultivos em áreas desmatadas após 2008 na Amazônia.
Entre as ações, a associação afirmou que apresentou nesta quarta-feira (11) uma denúncia formal ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade, órgão ligado ao Ministério da Justiça) contra o que chama de “práticas anticoncorrenciais das empresas signatárias da Moratória da Soja”.
“Após quase duas décadas de vigência do acordo e inúmeras tentativas de diálogo frustradas, a associação trouxe uma nova base jurídica e técnica que expõe como o pacto consolidou um cartel de compra, boicotando produtores que cumprem rigorosamente o Código Florestal”, afirmou a Aprosoja-MT.
Segundo a entidade, a moratória tornou-se uma “barreira supralegal”, gerando prejuízos estimados em 20 bilhões de reais para o Estado e afetando mais de 2,7 milhões de hectares.
Cientistas e ambientalistas, contudo, consideram que a Moratória da Soja ajudou a reduzir a taxa de desmatamento na Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, um baluarte contra a mudança climática, pois suas árvores absorvem grandes quantidades de gases de efeito estufa que aquecem o clima.
As mudanças no uso da terra e a atividade agropecuária são as principais emissoras de tais gases no país.
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Diferença para o Código Florestal
A despeito da pressão internacional e de vários setores contra novos desmatamentos, a entidade do principal estado agropecuário do Brasil considera que é preciso fazer valer a legislação brasileira (Código Florestal), que permite que os produtores desflorestem e usem parte das fazendas em suas atividades –na Amazônia, esse percentual é de 20% da área.
A entidade historicamente se posicionou contra a Moratória da Soja, enquanto uma lei do Estado de Mato Grosso aprovada neste ano, que deve ser regulamentada em breve, fortalece a posição da Aprosoja.
A legislação mato-grossense, publicada em outubro, revoga a concessão de benefícios fiscais a empresas que participam de acordos como o da Moratória da Soja.
“Gostaríamos que sim (que a lei colocasse fim à moratória). Mas não depositamos toda a nossa esperança nessa lei. Continuaremos adotando outras medidas, diversificando as estratégias e ampliando a mobilização”, afirmou a Aprosoja, à Reuters.
Segundo a entidade dos agricultores, o Código Florestal brasileiro “é o instrumento que deveria prevalecer”.
“Nosso compromisso é com as famílias prejudicadas por quase 20 anos (período de vigência da moratória), e estamos dispostos a contribuir com um sistema que respeite a legalidade”, destacou.
Essa não é a primeira vez que integrantes do setor produtivo recorrem ao Cade para denunciar o tema. Em setembro, o conselho instaurou um inquérito administrativo para apurar a possível manipulação de mercado relacionada à Moratória da Soja, segundo informação da Aprosoja Brasil.
Discussões da moratória
De acordo com a Aprosoja-MT, em quase duas décadas, “nenhuma indenização foi paga às famílias prejudicadas”, já que a entidade considera que os agricultores tiveram seus direitos de usar partes das áreas cerceados, uma vez que, se o fizessem, não poderiam vender qualquer volume da soja produzida nas fazendas, conforme define a moratória. Isso mesmo que algumas áreas produzam em terras desmatadas antes de 2008.
Organizações não governamentais ambientalistas disseram recentemente que, diante das conversas relacionadas com a lei de Mato Grosso, tradings (que fazem exportação e importação) de grãos estariam agora buscando enfraquecer o pacto, propondo que o embargo à compra de soja seja apenas para a área cultivada em terras desmatadas após 2008, e não para toda a propriedade, como acontece atualmente.
A Aprosoja afirmou também que a Abiove, que representa as tradings e processadoras de soja, “já sugeriu a modulação do acordo para restringir as sanções a um polígono específico, mas isso continua ferindo direitos” e não deve ser aceito.
Já a Abiove, que representa as tradings e processadoras de soja no Brasil, respondeu que, diferentemente do que diz a Aprosoja-MT, a Moratória da Soja é um “instrumento de defesa da agricultura brasileira” e não traz prejuízos ao setor.
“A moratória é uma resposta ao movimento do mercado consumidor”, afirmou o advogado da Abiove Francisco Todorov à Reuters, ressaltando que consumidores não querem comprar soja de áreas desmatadas na Amazônia.
“Se a soja não tivesse esse selo verde, a gente teria dificuldade de colocar esse produto no mercado”, destacou Todorov.
Segundo o advogado, o processo no Cade apenas foi instaurado porque é obrigatório quando parte de uma denúncia da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados, como foi o caso. Para ele, a nova denúncia da Aprosoja não deve mudar em nada o processo, que é confidencial e está em fase de avaliação preliminar.
Procurada para comentar quando e como aconteceria a regulamentação da lei, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado de Mato Grosso não se manifestou imediatamente.
A Aprosoja destacou ainda que a entidade segue defendendo “soluções construídas com diálogo, respeitando os maiores impactados: os produtores rurais”.
“Além disso, a preservação ambiental é um compromisso que já cumprimos sob a legislação brasileira. Querem algo além? Paguem por isso”, disse a Aprosoja, para quem isso é a “essência do desmatamento evitado”.
A entidade afirmou que gostaria que o acordo da moratória fosse “extinto”, permitindo uma união de esforços para avançar em “agendas fundamentais”, como a regularização ambiental, a adoção de instrumentos de incentivo, como é o caso do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), entre outros.
Sobre críticas de países como a França, a Aprosoja destacou que na Europa uma proposta de 4% de pousio (percentual de terra que teria que ser preservado) foi rejeitada por seus próprios produtores. “Se 4% é inviável para eles, por que 80% de reserva legal (como manda o Código Florestal, para a Amazônia) seria pouco para o Brasil?”.