No decorrer do ano, o Pantanal atravessa dois períodos: o do fogo e o da água. Neste ano, a temporada das chamas, que começaria em julho, chegou mais cedo e com força: em Mato Grosso do Sul e no Mato Grosso, os focos de incêndio nos seis primeiros meses de 2024 aumentaram 1025% se comparados ao mesmo período de 2023. Enquanto isso, o rio Paraguai, que é principal bacia do bioma, já registra seca recorde: está mais de 2 metros abaixo da média.
Em Mato Grosso do Sul (onde está 60% do Pantanal no Brasil) foram registrados 698 focos, entre janeiro e junho de 2024. No ano passado, foram 62 no mesmo período. Em Mato Grosso (onde fica 40% do bioma), foram 495 focos de incêndio em 2024, contra 44 em 2023. Somando os números dos dois estados, foram:
Os dados são do Programa de BDQueimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e também revelam que, em 2024, o Pantanal já tem o 2º maior índice de incêndios desde 2010, atrás apenas de 2020, quando o fogo consumiu cerca de 4 milhões de hectares — o equivalente a cerca de 26% do bioma.
Especialistas explicam que o período das chamas no Pantanal, que seria entre os meses de julho e agosto, pode durar até seis meses. Porém, neste ano, o fogo chegou mais cedo, e a seca também.
Em Corumbá, uma das principais cidades do Pantanal sul-mato-grossense, praticamente não chove há mais de 50 dias, de acordo com meteorologistas da região. Com os incêndios florestais e a baixa umidade do ar, uma densa fumaça se concentra sobre a cidade.
Na última semana, devido ao risco da aproximação do fogo e pela forte nuvem de fumaça que cercava o local, crianças tiveram que ser evacuadas de uma escola ribeirinha do município, e as aulas foram suspensas por 10 dias.
O Corpo de Bombeiros, que deflagrou a Operação Pantanal desde abril, afirmou no último dia 4 que equipes conseguiram conter o fogo em três parques estaduais na região: Pantanal do Rio Negro (Pantanal); Nascentes do Taquari (Cerrado); e Várzeas do Rio Ivinhema (Mata Atlântica).
Uma aeronave do governo do estado é usada para identificar e direcionar o combate às chamas.
A falta de chuva tem afetado a principal bacia do bioma, o Rio Paraguai, que abrange 48% do estado do Mato Grosso e 52% do Mato Grosso do Sul.
Segundo levantamentos do Serviço Geológico do Brasil (SGB), o nível do rio em Ladário – cidade vizinha à Corumbá – tem registrado quedas ou estabilidade na medição há cerca de um mês.
O órgão aponta que, para este período, a média histórica do nível do rio em Ladário era de 3,85 metros. Na última sexta (7), a régua de Ladário marcava 1,38 cm. Ou seja, o rio Paraguai estava 2 metros e 47 cm abaixo do esperado.
O pesquisador em Geociências da SGB Marcus Suassuna explica que o nível baixo do rio se dá pelo prolongamento do período seco de 2023 e também pelas poucas chuvas em 2024.
O Centro de Monitoramento do Tempo e do Clima de Mato Grosso do Sul (Cemtec-MS) apresentou um balanço relacionado ao acumulado das chuvas no estado, durante maio deste ano. O panorama não foi nada animador.
A pasta vinculada à Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc) observou que o cenário de chuvas está muito abaixo da média histórica, com valores de precipitações acumuladas entre 0 e 30 milímetros.
Na análise do número de dias com chuvas abaixo de 1 mm, foi constatado que grande parte dos municípios apresentaram mais de 25 dias sem ocorrência de chuvas ao longo de maio. As previsões para junho seguem na mesma esteira de seca e umidade baixa, o que expõe o solo facilmente ao fogo.
Em 13 de maio deste ano, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) declarou “situação crítica de escassez” na bacia do rio Paraguai. A decisão, válida até outubro, foi embasada diante do cenário crítico e da queda drástica do nível d’água do rio, por toda extensão.
O comunicado da ANA apontou que “o nível d’água do rio Paraguai em abril de deste ano atingiu o pior valor histórico observado em algumas estações de monitoramento ao longo de sua calha principal, sendo que o cenário de escassez ocorre desde o início deste ano na Região Hidrográfica do Paraguai”.
Além das perdas para o meio ambiente, a escassez do rio já afeta outros setores da sociedade. A ANA elencou os problemas ocasionados com o baixo nível:
A resolução da ANA sobre a escassez no rio Paraguai tem vigência até 31 de outubro, quando está previsto o fim do período seco na bacia, mas a medida pode ser prorrogada.
O WWF (World Wildlife Fund) levantou um alerta para a escalada no número de focos de incêndio neste ano. Segundo a ONG, os dados de 2024 são os piores desde 2020, quando o Pantanal sofreu com o maior período de incêndio já registrado.
De acordo com o monitoramento feito pelo Inpe, 2020 foi o ano que teve mais registros de fogo no Pantanal desde o fim da década de 1990.
Um estudo realizado por 30 pesquisadores de órgãos públicos, universidades e ONGs estimou que, naquele ano, ao menos, 17 milhões de animais vertebrados morreram em consequência direta das queimadas no Pantanal.
Mato Grosso do Sul e Mato Grosso já estão em situação de seca, segundo apontou relatório da ANA. Desde abril deste ano, a União incluiu o Pantanal em risco ambiental.
Pela portaria, consta que há declaração de emergência de março a outubro para as regiões centro-norte e leste de Mato Grosso do Sul; de maio a dezembro, para o Pantanal e no sudoeste do estado.
Também em abril, o governo de Mato Grosso do Sul assinou decreto de “Estado de Emergência Ambiental”. A medida foi tomada levando em consideração as mudanças climáticas que afetam todo o mundo e para precaver a temporada de queimadas no estado neste ano.
Com o decreto, foram definidas as seguintes medidas:
No mesmo mês, os governos de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e governo federal assinaram um termo de cooperação e defesa, proteção e desenvolvimento sustentável do Pantanal.
Na ocasião, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, sugeriu que o próximo passo seria elaborar um pacto pelo Pantanal. “Além dos governadores, envolvendo também os prefeitos, como a gente já fez com a Amazônia”.
O desmatamento no Pantanal, cuja trajetória é marcada por altos e baixos, teve queda de 9% entre agosto de 2022 e julho de 2023, segundo o último relatório anual do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes). Na Amazônia, a redução foi bem maior, de 21%.
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