O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que persistirá na busca para fechar o acordo entre Mercosul e União Europeia, que está sob risco de não ser concretizado. O petista enfatizou que só desistirá se ouvir um “não” de todos os países envolvidos nos blocos. Nessa batalha, ele conseguiu o apoio do chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, com que esteve, nesta segunda-feira, em Berlim. Em declaração conjunta, eles frisaram a importância do acerto.
“Eu só posso dizer que não vai ter assinatura (do acordo) na hora que terminar a reunião do Mercosul, que eu tiver o não. Enquanto eu puder acreditar que é possível fazer esse acordo, eu vou lutar para fazer, porque, depois de 23 anos, se a gente não concluir o acordo, é porque penso que estamos sendo irrazoáveis com as necessidades que temos de avançar nos acordos comerciais, políticos e econômicos”, argumentou.
Lula se disse “muito crente”. “Sou um homem que não desiste. Você está lembrado do slogan do meu primeiro mandato, sou brasileiro e não desisto nunca? Não vou desistir enquanto não conversar com todos os presidentes e ouvir um não de todos. Aí, vamos partir para outra”, sustentou.
O acordo sofre resistência do presidente francês, Emmanuel Macron. No sábado, o chefe de Estado afirmou que o tratado “não leva em consideração a biodiversidade e o clima” e que é “mal remendado”. O presidente eleito da Argentina, Javier Milei, também se diz contra.
Sobre o chefe de Estado europeu, Lula foi diplomático: “Respeitamos a posição dele. O que eu não posso dizer é que a gente ainda não vai assinar. Primeiro, porque além da posição da França temos uma posição da Argentina, que teve eleições, o novo presidente (Javier Milei) toma posse dia 10 — o Alberto Fernández (atual chefe do Executivo) vai participar da nossa reunião no dia 7. Nesta quarta-feira, haverá reunião dos ministros, dos chanceleres dos países do Mercosul, que vão tentar resolver alguma pendência técnica que exista”, explicou. “Quem sabe Scholz consiga falar com o nosso companheiro presidente da Argentina (Milei), quem sabe convence o Macron ainda”, acrescentou.
O chefe do Planalto acrescentou que vai ao Rio de Janeiro para reuniões e que está na expectativa de que “os bons ventos e o coração das pessoas estejam abertos”. “Quando me despedi do Macron, eu disse: quando você pegar o avião, que sentar na sua cadeira, abra o seu coração, converse com sua esposa e aceite fazer um acordo entre a União Europeia e o Mercosul. Ora, se isso não sensibilizou, eu não vou desistir do Macron. vamos ter outras reuniões, outras necessidades, e vou continuar até um dia eu conseguir”, continuou.
Segundo ele, a Cúpula do Mercosul, na quinta-feira, no Rio, será o “momento decisivo na negociação”. “Reiterei ao chanceler a expectativa de que a União Europeia decida se tem ou não interesse na conclusão de um acordo equilibrado. Num contexto de fragmentação geopolítica, a aproximação entre nossas regiões é central para a construção de um mundo multipolar e o fortalecimento do multilateralismo.”
O petista ressaltou que Macron não foi o único presidente da França contrário ao acordo. “Foi o (Nicolas) Sarkozy, (Jacques) Chirac, o nosso companheiro (François) Hollande, nenhum deles se propôs a fazer acordo com o Mercosul, porque eles têm problemas políticos e financeiros com os produtores franceses”, argumentou.
Olaf Scholz, por sua vez, prometeu esforços adicionais para que o acordo seja concluído. “Estou muito impressionado com o engajamento e a ambição do Brasil. Estou convencido de que será possível obter uma maioria nos dois órgãos, tanto no Conselho Europeu quanto no Parlamento Europeu. Peço a todos os envolvidos que deem uma prova de pragmatismo e celebrem o compromisso. Seria muito bom que o acordo saísse”, enfatizou.
A expectativa era que a COP28 seria a grande oportunidade para fechar os últimos pontos do acordo, com encontros de Lula com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e com outros chefes de Estado do continente. Até o momento, porém, não houve sinalização em prol de um acerto.
Lula também foi recebido, nesta segunda-feira, pelo presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, com quem discutiu avanços na economia, investimentos do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e meio ambiente, entre outros temas.
Para Wagner Parente — consultor em relações internacionais e CEO da BMJ Consultores Associados — é mais provável que Lula feche negociações já abertas com outros países do que efetivamente conclua o acordo.
“Há uma grande chance de o Brasil investir um pouco mais nas negociações já abertas. Por exemplo, o acordo com os Emirados Árabes Unidos no qual o Brasil tem uma um grande interesse ofensivo de colocar seus produtos para o mundo árabe, usando os Emirados Árabes como hub de exportação”, afirmou. “Ao mesmo tempo, há pouco interesse defensivo, porque eles não produzem nenhum grande bem sensível que possa levantar grandes oposições na indústria brasileira.” Para ele, essa seria ainda uma forma de pressionar a União Europeia, avançando com outros parceiros.
A tensão entre promover o comércio internacional e proteger o meio ambiente coloca em evidência os desafios enfrentados pelos líderes mundiais na busca por soluções que conciliem o crescimento econômico e a responsabilidade ambiental, observou Eduardo Galvão, professor de relações internacionais do Ibmec Brasília.
“A pressão interna no Brasil, com sindicatos e economistas alertando para os possíveis desequilíbrios do acordo, destaca a complexidade da situação. A postura do novo presidente argentino e as mudanças na presidência temporária da UE são outros fatores que adicionam incerteza ao processo”, avaliou. “Enquanto os diplomatas tentam superar os obstáculos, o mundo aguarda para ver se um acordo comercial entre o Mercosul e a UE será concretizado e como ele será moldado para atender tanto às necessidades econômicas quanto aos compromissos ambientais”, concluiu.
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