Secretaria de Meio Ambiente alega que o Pantanal está vivenciando um ciclo normal de seca e cheia e que, por isso, a distribuição de água por voluntários poderia atrapalhar a vida da fauna na região.
A Justiça de Mato Grosso concedeu uma liminar ao Grupo de Resposta a Animais em Desastres (Grad), que permite aos voluntários levar água para os animais nos pontos mais críticos de seca na região da Transpantaneira, no Pantanal. A ação da ONG contra o estado teve início após a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema) tentar impedir a instalação de pontos de distribuição de água à fauna.
A reportagem entrou em contato com a Sema-MT, mas não obteve resposta até esta publicação.
Conforme a decisão assinada pelo Antonio Horácio da Silva Neto, nessa sexta-feira (13), a alegação do governo do estado de que o Pantanal “está vivenciando um ciclo normal de seca e cheia”, não pode ser considerado como argumento para negar a ajuda aos animais diante da realidade que o bioma enfrenta.
Um estudo feito pelo MapBiomas Brasil apontou que o Pantanal, proporcionalmente, foi o bioma que mais secou ao longo dos últimos 40 anos. A superfície da água em 2023 foi 61% abaixo da média histórica. O ano de 2023 foi 50% mais seco do que 2018, quando ocorreu a última cheia no bioma. A região também teve 9 milhões de hectares queimados, o que representa 59,2% do território. O levantamento analisou dados de 1985 a 2023.
Em uma reunião realizada no dia 19 de agosto, com representantes da ONG Grad, Sema, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Corpo de Bombeiros, foi discutido ações de fornecimento de água aos animais no Pantanal. Na ocasião, o estado foi contra a intervenção para dessedentação provisória.
Durante a discussão, um servidor da secretaria citou que os períodos de cheia e seca no bioma são normais e necessários, pois “algumas espécies de peixe têm mesmo que morrer para virar adubo para que o novo ciclo de água aquele local tenha mais nutrientes”.
“Tem uma série de ecologia no Pantanal que precisa ser levada em consideração e colocar três ou quatro pontos de água vai servir a quantos animais? E os outros? Pontos na Transpantaneira realmente é efetivo ou ele vai fazer com que haja mais atropelamento de fauna ali? Enquanto não tenho essas respostas com efetividade cientifica, toda intervenção tem que ser no mínimo considerada como temerária”, disse.
Com a decisão, o estado não pode mais impedir que os voluntários do Grad criem pontos de distribuição de água e, se necessário, de alimentos e cuidados médicos emergenciais, para os animais afetados no bioma. Por sua vez, a ONG deverá realizar relatórios e encaminhar à Justiça, a cada 15 dias, sobre as ações e a inexistência de prejuízo para a fauna e ao meio ambiente.
“Essa batalha foi marcada pelo negacionismo e a resistência de autoridades que minimizaram a gravidade da situação. Mas nós não desistimos. Enquanto alguns insistiam em negar a urgência, os animais sofriam com a falta de água”, ressaltou a ONG.
Estado em emergência
Desde janeiro deste ano, Mato Grosso lidera o número queimadas do Brasil, com cerca de 40 mil focos de queimadas. Em agosto, o governo do estado decretou situação de emergência devido à seca severa e aos incêndios florestais.
Um levantamento de secas e impactos no Brasil, divulgado pelo Governo Federal no início do mês, revelou que Mato Grosso tem 24 municípios na lista de cidades com condição de seca extrema. A projeção para setembro alerta também para o agravamento da seca em diversas regiões do Brasil, com destaque para Mato Grosso, que deve expandir a condição para 73 municípios.
No Pantanal, o número de focos de incêndios neste ano já supera o registrado no mesmo período de 2020, ano recorde de queimadas em todo o bioma, que abrange Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. No primeiro semestre, o aumento em comparação com 2020 é de 8%. Há meses, especialistas alertaram para uma temporada de fogo devastadora.
A situação dos animais
Desde o início da temporada de seca e incêndios florestais, centenas de animais foram vistos em busca de água e até atolados em uma quantidade excessiva de lama, principalmente, na região da Transpantaneira.
De acordo com o Grad, a ausência de água e a vegetação seca ocasionam a desidratação e a desnutrição dos animais, já que eles não conseguem encontrar alimento.