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O Pantanal é ecótono, uma região resultante do contato entre dois ou mais biomas fronteiriços. Sem as relações com Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica, o bioma que está em Mato Grosso do Sul e em Mato Grosso não existiria da forma que existe. Veja o vídeo acima.
Com a seca extrema que a atinge a maioria dos estados da região Norte do Brasil e o aumento de focos de incêndio na Amazônia, especialistas ouvidos pelo g1 alertam para o risco de uma temporada de queimada e seca mais severa para o Pantanal.
O aumento de eventos climáticos extremos junto com a presença de El Niño são o combo de alerta para uma período de seca mais extremo e aumento das queimadas no Pantanal, segundo especialistas no bioma e em meteorologia.
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O Pantanal pode ser comparado a um mosaico. O bioma é um ecossistema formado por outros ecossistemas. Na biologia, estes espaços são chamados de ecótonos —lugares singulares que possuem espécies de fauna e flora específicas dessas regiões.
Até setembro deste ano, no bioma Amazônia foram registrados 25.414 focos de incêndio. Sem chuva, oito estados do Norte e do Nordeste bateram recorde de seca dos últimos 40 anos.
O biólogo e um dos diretores da Organização Não Governamental (ONG) SOS Pantanal Gustavo Figueirôa explicam que o aumento de queimadas na Amazônia e a seca que atinge a região Norte pode ser refletida no Pantanal.
“O Pantanal é um mosaico. O bioma é um encontro de vários biomas, onde sofre a influência direta de vários biomas, como a própria Amazônia e o Cerrado, além da Mata Atlântica, do Chaco e do Bosque Chiquitano, que são biomas de outros países”, detalha Figueirôa sobre a influência que forma o Pantanal.
Mais seca na Amazônia quer dizer menos chuva. Com isso, a evaporação de água também cai. Assim, o Brasil Central, região em que fica o Pantanal, poderá sofrer com a falta de chuva, segundo especialistas.
“Com a diminuição do número de evaporação de água na Amazônia, que traz águas para o Centro-Oeste, com a diminuição das matas ciliares no Cerrado, que é onde nascem os rios que banham o Pantanal, o aumento da seca é inevitável. Vários fatores somados da ação humana estão diminuindo a capacidade do Pantanal, porque o Pantanal depende da água que vem de fora”.
Sem a água que se tornaria vapor e seria transportado por rios flutuantes (nuvens) até o Pantanal, a tendência é de menos chuva. Sem chuva, há seca, e com a seca, o bioma fica mais exposto a queimadas, explica o biólogo.
“É uma ação direta da seca, os incêndios. Além da falta de recursos para os animais, os incêndios são ocasionados por essa seca e esse calor extremo. Então a gente já está vendo quais são os impactos acontecendo ao vivo agora. […]O Pantanal é um bioma muito frágil ligado a água, sem água o Pantanal não é o que é. Então isso está completamente ligado, é uma ligação direta do que acontece com o Cerrado e Amazônia, tem influência direta sobre o Pantanal”.
Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) já apontam um 2023 diferente do registrado em 2022.
Os números mostram que de janeiro a outubro do ano passado foram computados 1.189 focos de incêndio, neste ano já são 1.629 no mesmo período. Um aumento de 36%.
Segundo o Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa/UFRJ), cerca de 311.575 hectares já foram consumidos pelo fogo neste ano, o que representa 2,06% da área total do bioma.
O levantamento para outubro demostrou pontos com mais focos ativos neste mês:
Mato Grosso do Sul
Mato Grosso
O Sistema para Pesquisas e Gerência de Informações sobre Focos de Fogo da Nasa, o FIRMS, indica que pelo menos 480 focos de calor estavam ativos no Pantanal até esta segunda-feira (23). Na imagem abaixo, cada ponto vermelho é uma nova concentração de chamas.
Comparação da NOAA mostra El Niño em 1997 e em 2023. Cores mais alaranjadas mostram que os oceanos estão mais quentes este ano. — Foto: NOAA/Divulgação
A explicação dos meteorologistas para a seca no Norte e as intensas chuvas no Sul do Brasil é o Super El Niño que afeta o Brasil.
Segundo o professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo e membro do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), Paulo Artaxo, o El Niño até poderia beneficiar o Pantanal em questão da chuva, mas as mudanças climáticas adversas estão desregulando o caminho da água que chegaria a região pantaneira.
Artaxo explica que em ano de El Niño, a tendência seria chover mais na região Centro-Oeste, em especial em Mato Grosso do Sul. Porém, os eventos climáticos extremos podem fazer com que as precipitações (chuva) diminuam na região, mais forte no Pantanal Norte, no Mato Grosso.
O especialista apresenta três fenômenos que estão interligados e que podem contribuir para uma temporada de queimadas mais rígida no Pantanal:
“A combinação destes três não é linear e tem interpelação complexa. Isso dificulta fazer previsões. Realmente podemos esperar o aumento de eventos climáticos adversos, como secas severas que tendem a aumentar os incêndios. É possível que possamos ter uma seca muito mais intensa neste ano, em particular. Os eventos climáticos extremos estão predominando em contraponto aos efeitos climáticos normais”, enfatiza o especialista.
O rio Paraguai é a principal afluente do Pantanal, é como se fosse o coração do bioma que pulsa água para outros pequenos rios e braços d’água.
Além da questão ambiental, o rio é uma importante hidrovia. Em 2022, movimentação de cargas pelo rio Paraguai a partir dos portos de Mato Grosso do Sul superou 4,2 milhões de toneladas.
Neste momento, o rio Paraguai passa pelo período de vazante, que é quando a água começa a descer pelo afluente e se espalhar pelo bioma. O momento que deveria ser mais extenso e elevar os níveis do rio está sendo completamente diferente do esperado
O pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Pantanal e especialista em estudos sobre o rio Paraguai, Carlos Padovani, explica que o afluente já está abaixo do nível de dois metros, o considerado crítico. O cientista também dá uma previsão: a possível inviabilização do transporte pela hidrovia.
“A tendência é passar dos 1,30 metro. É preocupante! Pelo menos neste período de seca vai ter interrupção do transporte hidroviário. Os navios podem encalhar, não vão conseguir trafegar”, antecipa Padovani.
Com menos água no período de vazante, as vegetações que ficam às margens do rio Paraguai ficam mais expostas ao fogo. “Quando os rios secam muito, as regiões de várzea secam também. A vegetação do rio pode ficar mais exposta. A água da chuva não tem uma previsão tão boa. O El Niño que provoca seca na Amazônia também pode influenciar no Pantanal”.
O pesquisador da Embrapa comenta que a previsão para até dezembro deste ano é de seca. As próximas chuvas podem responder na métrica do rio, porém, só em abril de 2024.
“O rio pode estacionar nos níveis mínimos. Se não tivermos chuvas, conforme o padrão, a tendência é continuar a descida rápida do rio. Quando chegar nas mínimas, elas vão ser permanentes. Quando começar as chuvas, vai demorar para reestabelecer os padrões normais dos rios”.
Desde 2021, quase um ano após os incêndios catastróficos de 2020, no Pantanal, Mato Grosso do Sul possui um Plano Estadual de Manejo Integrado do Fogo (PEMIF), que estabelece instrumentos, diretrizes e regulamentos para o trabalho de orientação, prevenção e combate aos incêndios florestais.
Além do PEMIF, Ongs, instituições de preservação ao meio ambiente, Corpo de Bombeiros, PrevFogo e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos (Ibama) atuam no treinamento de brigadas e a formação de novos brigadistas.
Em Campo Grande, o Centro de Proteção Ambiental (CPA) do Corpo de Bombeiros funciona com o monitoramento de imagens de satélites. A análise é feita para direcionar as guarnições para os pontos mais sensíveis em que há necessidade de atuação dos bombeiros.
O monitoramento é feito pelo Sistema de Comando do Incidente em Campo Grande, com imagens de satélite que são analisadas 24h por dia. Assim é possível fazer o acompanhamento em caso de aparecimento e evolução dos focos de calor.
Desde o início de 2020, as ações contra incêndios aumentaram, conforme frisa o biólogo e representante da ONG SOS Pantanal.
“Tem mais estrutura, tem uma atenção maior para o tema e tem mais atividades de educação ambiental, então são alguns papéis, alguns trabalhos que são desenvolvidos, alguns são mais pelos governos estadual e federal e municipal, outros são mais pela sociedade civil, mas o principal são a formação de brigadas e estruturação dos órgãos de combate e uma sala de controle, uma sala de monitoramento para assim que começar os focos”.
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