Em votação histórica, Câmara aprova a reforma dos impostos, depois de o tema passar mais de três décadas em discussão
Com o plenário praticamente vazio, mas com 510 presenças marcadas — por meio da votação remota, já que boa parte dos deputados retornou aos respectivos estados —, a Câmara aprovou, com 365 votos favoráveis e 118 contrários, além de uma abstenção, a histórica reforma tributária, debatida por mais de 30 anos. Na primeira rodada de apreciação, o placar foi de 371 a 121, com três abstenções.
A proposta de emenda à Constituição (PEC) já havia sido votada na Câmara e no Senado, onde a matéria passou por muitas mudanças. Para evitar que voltasse à apreciação dos senadores, o relator, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), fez alterações pontuais, suprimindo os temas mais polêmicos que não tiveram acordo. A expectativa do governo é que a promulgação ocorra ainda neste ano.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, elogiou o trabalho do Congresso e festejou o resultado. “Penso que é um dia realmente importante para o Brasil, depois de muitos anos que se fala em reforma tributária. O Brasil amadureceu, sabe que precisava enfrentar essa agenda, que é a mais importante das reformas, porque ela organiza o sistema produtivo, coloca o Brasil em compasso com o que tem de mais moderno no mundo”, enfatizou. “E eu penso que, pelo que ouvi dos senadores, o texto-base aprovado na Câmara será promulgado ainda este ano.”
Haddad também mencionou a aprovação, pela Câmara, da Medida Provisória 1185, da subvenção do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), uma das apostas da equipe econômica para aumentar a arrecadação — o texto segue, agora, para o Senado. “Sei que nossa jornada não termina com a 1185 e com a reforma tributária. Demos passos importantes neste ano, mas eu acredito que, pelos indicadores da economia, estamos terminando o ano com bons resultados”, frisou.
Entre os temas suprimidos pelo relator na Câmara, está o item que criava a Cide-Manaus, um dos itens mais controversos. Tratava-se de uma cobrança feita sobre produtos que tivessem industrialização incentivada na Zona Franca de Manaus, mas que fossem produzidos em outros estados. Aguinaldo Ribeiro rejeitou o dispositivo, introduzido pelo relator no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), mas retornou à proposta um texto com o mesmo teor, só que com cobrança do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) – Zona Franca de Manaus. A diferença é que, com a Cide-Manaus, os recursos recolhidos seriam destinados ao Fundo Amazônia.
Outro trecho excluído foi a cesta básica estendida, que teria desconto de 60% sobre a alíquota padrão para produtos que não entrariam na lista da cesta básica nacional, com isenção total. Ainda não se sabe quais itens são esses, porque a PEC determina que sejam definidos por meio de lei complementar.
O relatório do Senado determinou “que se considere a diversidade regional e cultural da alimentação do país e se garanta a alimentação saudável e nutricionalmente adequada”, acrescentando à cesta nacional, a Cesta Básica estendida, com alíquota reduzida em 60% e cashback obrigatório para a população de baixa renda.
Ao retirar o tema, o argumento do relator foi de que “a PEC já garante o mesmo tratamento para alimentos e produtos de higiene a serem elencados na lei complementar, com possibilidade de cashback, não havendo sentido em obrigar o legislador complementar a decisões que seriam mais bem ponderadas de acordo com os recursos e limitações de cada época”.
Ribeiro também eliminou a possibilidade de redução em 100% da alíquota na aquisição de medicamentos e dispositivos médicos por entidades de assistência social sem fins lucrativos, como previa o texto de Braga. O relatório alega o “difícil controle” e suprime também o benefício nas aquisições pela administração pública “por ser desnecessário, tendo em vista o regime diferenciado de compras governamentais”.
Divergência
Braga sinalizou suas divergências às alterações feitas por Ribeiro, nesta sexta-feira, e afirmou que pode recorrer ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no momento da promulgação para que o texto trâmite novamente na Casa. “A promulgação é sempre do presidente do Congresso. A avaliação é dele e pode entender que há a necessidade, ou não, de o texto voltar ao Senado. Ele fará a avaliação final”, argumentou.
A oposição tentou adiar a votação, bem como tentou aprovar 11 destaques no primeiro turno e outros dois no segundo que, porém, não foram acatados. A bancada do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, inclusive, viu 16 de seus deputados votarem a favor da medida em primeiro turno; no segundo, foram 15, mesmo com a orientação contrária. Na primeira passagem da reforma tributária pelo plenário da Câmara, em julho, pelo menos 20 parlamentares da sigla também foram favoráveis, o que provocou desconfortos entre os correligionários.
O novo sistema tributário transforma cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) no Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) vai substituir os tributos estadual e municipal e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) ficará em lugar dos tributos federais.
O texto estipula a alíquota padrão a ser paga na maioria dos produtos. Haverá uma alíquota reduzida, de 30%, 60% ou 70% para produtos ou serviços que foram excepcionalizados nos debates da Câmara. A PEC criou, ainda, o Imposto Seletivo (IS), para sobretaxar produtos que façam mal à saúde.