Aproximação dos presidentes da República e do Senado, a pretexto da situação financeira do estado, mira futura parceria eleitoral contra Zema. Governador é adversário político de ambos
Em duas entrevistas no intervalo de uma semana, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), citou o nome do presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo menos 40 vezes. E sempre num tom de uma proximidade que não se via até agora. A razão oficial é a crise financeira de Minas Gerais, estado hoje administrado por um desafeto do grupo político de ambos, o governador bolsonarista Romeu Zema (Novo).
Pacheco tem se apresentado, em suas palavras, como o “interlocutor” para solucionar a “impagável” dívida de R$ 160 bilhões de Minas com a União, situação que mantém o estado à beira do colapso. O senador se reuniu duas vezes com o presidente para discutir o assunto e o cita sempre, deixando a impressão de que a parceria é duradoura.
“Assumo integralmente o papel de interlocutor, se assim quiserem me considerar. Falei com o presidente Lula, uma conversa que terá desdobramentos. E vou levar a ele algo mais palpável, com alternativas para solucionar um problema que envolve União e estado”, disse Pacheco ao Correio.
A um grupo de jornalistas, ao falar do assunto, Pacheco, numa frase só, se referiu sequencialmente ao presidente da República. “Todas as ideias (de solução da dívida) foram levadas ao presidente Lula, sem formalização. O presidente Lula mostrou muita boa vontade em atender. O presidente quer resolver o problema de Minas. Ele tem toda disposição. Falei pessoalmente com ele duas vezes. O Alexandre (Silveira, ministro das Minas e Energia) também falou. A disposição dele é grande. Precisamos dar uma solução sustentável e definitiva para esse problema. Há uma percepção do presidente Lula em ajudar a dar essa solução”, afirmou Pacheco, ao lado do ministro, do presidente da Assembleia de Minas (ALMG), deputado Tadeu Leite (MDB), e de parlamentares federais e estaduais.
Apesar da distância que Zema mantém de Brasília, o líder de seu governo na ALMG, João Magalhães (MDB), estava presente à reunião coordenada por Pacheco.
A percepção é de que está sendo ensaiada uma dobradinha política entre Lula e o senador. O nome do parlamentar como o candidato do petista ao governo de Minas, em 2026, está colocado. O PT não tem um candidato forte ao cargo e tem se restringido no estado a ganhar prefeituras de cidades médias.
Desse grupo mineiro, reunido esta semana na Presidência do Senado, um dos parlamentares foi abordado pelo Correio e perguntado sobre a possibilidade de costura política. Desde que não fosse identificado, respondeu: “É impossível não pensar nessa projeção. É uma união ideal”, avaliou.
O mandato de Pacheco termina em 2026, mas, como presidente do Senado, segue até fins de 2024. O discurso para fora é que se dará por satisfeito, na vida pública, de aprovar a Reforma Tributária, sanear as contas de Minas e — novo desafio a que se comprometeu — aprovar o fim da reeleição para cargos no Executivo.
“Para quem projetou cumprir apenas um mandato de deputado, fui longe. Tenho compromisso com a Presidência do Senado. E entregando a Reforma Tributária, resolvendo o problema da dívida de Minas e, eventualmente, conseguindo acabar com a reeleição, considero ter cumprido um bom propósito na vida pública”, avaliou.
Comedimento e discrição
Tendo o comedimento como marca, Pacheco é de evitar confrontos ou tons elevados, mas tem marcado posições. Nas rusgas entre senadores e o Supremo Tribunal Federal, por exemplo, defende mandato para os ministros da Corte. Também anunciou que votará a favor da emenda constitucional que restringe a decisão monocrática de integrantes do STF. Na contramão da maioria de seus colegas, disse que votou a favor da indicação de Igor Roque, por Lula, para o comando da Defensoria Pública da União (DPU) — foi derrotado por 38 a 35 e precisava de 41 votos para ser aprovado.
Sobre a relação com o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), que está longe de ser das melhores, Pacheco prefere dizer que “não temos a frequência de diálogo”. A solução do senador para o problema financeiro do estado passa por três eixos: pela quantificação exata do tamanho da dívida com a União, se de fato é de R$ 160 bilhões; pelo impedimento de privatizar as estatais Codemig (Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas), Cemig (Companhia Energética Minas Gerais) e Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais), mas entregá-las para a administração do governo federal como abatimento na dívida; e pelo estabelecimento de um cronograma de liquidação do restante da dívida num prazo de 10 anos.
“Vamos contribuir para uma solução que não sacrifique o servidor público, que não tenha seus salários congelados. Que não sejam sacrificados os professores, os policiais militares, os civis, o pessoal da saúde. E que nossos ativos (as estatais) não sejam entregues a empresas privadas a qualquer preço”, disse.
Sobre o futuro na vida pública, Pacheco repetiu o mantra de velhas raposas políticas mineiras de que Minas sempre precisa estar num local de destaque no cenário nacional. Citou até mesmo a composição de uma chapa presidencial.